Relações abusivas

Relacionamento abusivo é qualquer tipo de vínculo – seja ele familiar, social, profissional ou amoroso – que estabelecemos na vida e provoca desconforto, angústia ou sofrimento, geralmente para todos os envolvidos. Essas relações são tóxicas pois nos causam irritações, nos aborrecem, onde estamos sempre em desacordo, gerando estresse e inúmeras discussões, mas por algum motivo não conseguimos romper esse vínculo danoso. Surgem sentimentos de raiva, culpa, desânimo, mágoa e até mesmo fracasso por se ver impotente diante de uma luta que parece inglória. 

O sentimento é de que não conseguimos simplesmente mudar nossas atitudes e repetimos comportamentos que nos faz sentir presos nesses padrões repetitivos que nos aprisiona de forma tão intensa. E mesmo reconhecendo essas emoções infelizes não conseguimos perceber sozinhos uma saída para romper com esses laços nocivos. É como saber que vou cair num buraco e mesmo assim continuar caminhando até ele

Pode parecer estranho, mas em uma relação abusiva quase sempre existe amor. A questão é que este é um mal amor, um amor cego, inconsciente. O bem-estar e a paz nas relações só existe quando há o bom amor, e para que ele flua, precisa ser precedido pela ordem, conforme revelou o pensador alemão Bert Hellinger, criador das Constelações Familiares.

Trazendo isso dentro de uma visão mais ampla podemos enxergar muitas vezes que por trás de um comportamento violento está em sua maioria um trauma de infância (abandono, maus-tratos etc.) ou a triste repetição de um padrão de comportamento destrutivo herdado de forma inconsciente de gerações anteriores: pai, avô, bisavô, etc. A vítima também pode muitas vezes estar repetindo um destino vivenciado pela mãe, avó ou bisavó. São histórias do passado que ficaram sem solução e que permanecem vivas dentro da memória das células, como na memória do sistema familiar. Essa memória chamamos de inconsciente.

Tanto o agressor quanto a vítima trazem consigo as memórias de grandes sofrimentos.  Essas memórias são aparentemente apagadas da consciência, mas armazenadas no inconsciente, uma vez que não temos resiliência ou condição de elaborar a situação no exato momento em que acontecem. Segundo o médico americano Peter Levine, PhD, criador da Experiência Somática, abordagem neurocientífica, e autor do livro “Uma voz sem palavras – como o corpo libera o trauma e restabelece o bem-estar”, existe uma série de fatores que determinam o armazenamento do trauma ou memória de dor no inconsciente, como a grandeza do evento estressante, idade em que ocorreu o trauma e predisposição genética.

Sempre que algum acontecimento tiver alguma semelhança com a memória de dor, o conteúdo vem à tona através de sentimentos negativos, sensações desagradáveis, comportamentos inoperantes, entre outras, como forma de lembrar que, aquela dor, causada pelo evento do passado, não foi ressignificada ainda e continua atuando no inconsciente, como um ciclo vicioso.

 O primeiro passo na direção da solução é a vítima se empoderar, assumindo a sua posição do seu Eu Adulto. Nessa posição de Eu adulto  a vítima faz escolhas conscientes ou seja aceitar e dizer SIM para tudo que foi na sua vida. Assim, ele/ela poderá liberar os congelamentos, pactos, identificações com problemas dos seus familiares para que possa escolher uma vida diferente. A partir dessa posição a vítima poderá reconciliar-se com o perpetrador ou agressor. Reconciliar não é o mesmo que perdoar. Perdão coloca a vítima numa posição superior e dificulta a reconciliação. A reconciliação só pode ser feita entre dois iguais. Isso demanda que a vítima abra mão do orgulho, o desejo de reparação ou vingança do que sofreu, o que é ainda mais difícil, pois em geral a vítima busca ter razão. Aquele que está “certo” também se sente inocente, está cheio de direitos e também de resistência a mudanças.

Nesses casos, o que ajuda é quando a vítima olha para o perpetrador, entende a origem do conflito e deixa ele lidar com a culpa e as consequências de suas ações. E depois disso se retira de tudo e constrói algo de bom para si a partir dessa experiência. “Então o que passou é deixado para trás e fica resolvido para ela”, diz Bert Hellinger. Para o agressor, o que realmente cura é reconhecer os danos, dizer “sinto muito” e assumir a culpa e as consequências. Isso também o empodera e o coloca na posição de adulto, de onde pode agir com autonomia.

“A reconciliação começa em nossa alma. Quando o que quer que seja que rejeitamos, ou do qual temos vergonha é reconhecido e mesmo amado, então nós podemos nos tornar mais completos e em paz.” Bert Hellinger

#dicadoAnand:

A Constelação familiar auxilia muito nesse movimento de romper de vínculos profundos. Esses vínculos são sentidos, vivenciados e harmonizados dentro do campo morfogenético (memoria familiar) da constelação familiar. Neste sentido, há a possibilidade de surgir uma nova compreensão do sentido da vida, a partir de uma nova perspectiva, revelada pela constelação. Faça o seu movimento.

Fonte:

  • ROMANO, E. (Diálogos Interdisciplinares) 22-28 pp. Revista Psicologia – Especial Constelação Familiar, Editora Mythos, 2016.
  • Levine, Peter. Uma Voz Sem Palavras. Como o corpo libera o trauma e restaura o bem-estar. São Paulo. Summus Editorial, 2010.